11 julho 2009

Music Animation Machine

M A M
MUSIC
ANIMATION
MACHINE
Já assistiu ao vídeo abaixo?





Ele é atribuído a um tal de Hattariyaro, e permaneceu vários dias na minha coluna de Vídeos (na parte direita desta página).

Quem viu deve ter achado interessantíssimas aquelas figurinhas que vão aparecendo no meio das músicas. Como entusiasta dos arquivos MID, resolvi fazer algo parecido. O resultado é SPIDERM.MID, uma música que mostra o nome deste blog (veja imagem abaixo).


Para visualizar a imagem acima, no entanto, você precisará também de um MIDI PLAYER especial: o MAM (Music Animation Machine). Ele serve para tocar MIDs enquanto exibe uma representação gráfica de suas notas.

Se quiser, você pode baixar somente o MANUAL.



DICAS

. Depois de baixado, o MAM não precisa ser instalado: basta descompactá-lo.


. Ao executar o programa, selecione a música que eu modifiquei (SPIDERM.MID) em FILE / OPEN, e depois selecione VIEW / DISPLAY TYPE / PIANO ROLL (MAM). A seguir, tecle na barra de espaço e, pronto, a música começará a tocar.


. Mas, atenção: eu só inclui esse único textinho que aparece logo no início – não perca seu tempo ouvindo toda a música achando que vão aparecer mais textos ou figuras.


. No MAM, o usuário pode optar entre outros tipos de representação gráfica. Hattariyaro escolheu, por exemplo, a “tonality compass + bars”.



Você gostaria de fazer o mesmo?

Primeiro, selecione uma música em formato MID e a carregue num sequenciador do tipo Cakewalk (como o Anvil Studio, que é gratuito).

Para melhor entendimento, estou mostrando, abaixo, a tela de um sequenciador MID já carregado com uma música qualquer. Nesta tela, há duas representações diferentes de um mesmo trecho dessa música: no quadro superior, o trecho está representado em um diagrama “piano roll”; no quadro inferior, ele está representado em notação musical (partitura):



O que eu fiz (e o que Hattaniyaro deve ter feito também) foi incluir notas no diagrama “piano roll” de modo que elas tivessem, não tanto um significado musical, mas um significado visual:



Não se preocupe com a partitura, pelo menos por enquanto. O único lugar onde se deve mexer é no diagrama “piano roll”.

Acredito que Hattariyaro tenha incluído todas as figuras da mesma forma que eu, ou seja, manualmente, uma nota de cada vez. Isso não é difícil, mas é trabalhoso. Além disso, é preciso que as notas combinem com a própria música que está sendo tocada (sem truques, do tipo notas mudas – que aparecem na figura, mas não têm função nenhuma na música).

Obs: Neste exato momento, passou pela minha cabeça uma idéia meio diferente: fazer (e disponibilizar gratuitamente) um programinha para facilitar este trabalho. Assim, qualquer pessoa, mesmo sem saber quase nada de Música, poderia inserir textos e imagens nos arquivos MID de sua preferência, escolhendo, inclusive, os pontos em que eles deveriam aparecer.

Se eu resolver, realmente, levar essa idéia adiante, darei notícias diárias, aqui, sobre o andamento deste projeto. Aceito sugestões.


Um pouco mais sobre o MAM

O idealizador do MAM chama-se Stephen Malinowski:



A idéia de associar sons com imagens não é nova. Disney, por exemplo, teve a idéia de sincronizar desenhos animados com peças clássicas em Fantasia. O efeito dessa junção é sinérgica: não só as cenas ganham em emoção, mas a própria música se torna mais inteligível.

Mas a idéia inicial de Malinowski era criar uma alternativa melhor que a notação musical tradicional, que, em sua opinião, era pouco explicativa. Ele mesmo tem preparado alguns vídeos em que demonstra o seu programa. Veja este:



A notação tradicional é eficaz quando se trata de nos informar o que faz cada instrumento durante a execução de uma sinfonia, mas nada nos diz sobre os contrapontos e harmonias resultantes, que ficam dispersas na partitura, como gotas de tinta num oceano. O MAM tenta unir as peças desse quebra-cabeças, desvendando, para nós, a influência que cada nota tem sobre as demais. Mas a sua principal virtude mesmo está em ser a melhor ferramenta que eu conheço para descortinar os mistérios das grandes obras. É realmente fascinante poder "assistir" à complexidade de uma sinfonia que nos habituamos a ouvir por tantos anos, ou o contrário, isto é, ouvir os “sons” que se revelam por trás das imagens que o programa nos exibe.

Tenho visto pessoas acharem que uma sinfonia (tal como a ouvem, executada por uma orquestra) é uma obra coletiva. Para elas, é como se Beethoven, por exemplo, fosse autor somente dos temas de suas sinfonias, cabendo aos músicos e ao maestro da orquestra não somente tocá-las, mas também preencher o resto, usando técnicas e fórmulas que eu nem me arrisco a conceber. Na minha opinião, o MAM ajuda estas pessoas a compreender melhor a realidade dos fatos. É bem possível que elas se espantem ao saber que a Nona Sinfonia não é uma obra coletiva, que cada nota que elas ouvem foi escrita por Beethoven mesmo, e por mais ninguém. Por mais que os músicos, e o próprio maestro, sejam profundos conhecedores de música, eles não estão fazendo nada além de TOCAR o que Beethoven escreveu (emprestando, é lógico, a técnica e a interpretação de que são capazes).

O MAM deixa tudo isto bem evidente na medida em que nos faz enxergar, por meio de um verdadeiro show visual, a estrutura interna das grandes composições. É como se a sincronia entre o que vemos e o que ouvimos estabelecesse uma ponte entre a Arte dos Sons e as Artes Plásticas. Passamos a aceitar, então, também para a Música, um conceito que, para nós, é perfeitamente natural no mundo das artes visuais: o de que uma obra de arte, por mais complexa que seja, pode ter somente um autor (que é, também, no caso da Pintura e da Escultura, o seu único executor).

Tudo o que disse acima pode ser óbvio para mim e para você, mas, acredite, há muita gente que vai a concertos sem a menor noção do verdadeiro motivo pelo qual Bach e Beethoven são considerados gênios da Humanidade. É aí que eu vejo a melhor contribuição que o MAM pode prestar à Música: fazer com que se entenda melhor não somente a grandiosidade de uma obra-prima, mas também o verdadeiro significado da palavra "compositor".


Um vídeo como este abaixo é perfeito para o ouvinte que quer ser introduzido ao Mundo da Polifonia:




O vídeo a seguir serve para convencer o ouvinte sobre a relação direta que há entre a complexidade do que ele vê com a do que ele ouve:




OUTROS VIDEOS RELACIONADOS AO MAM

Hattariyaro disponibiliza vários vídeos legais no CANAL DE HATTARIYARO.


RETRO GAME MEDLEY

No vídeo abaixo, Hattariyaro optou por uma sonoridade típica dos videogames antigos.




MIDI ANIMATION “CHRONO TRIGGER”

O vídeo a seguir dá uma idéia melhor (para os que não têm muito conhecimento sobre as possibilidades do MIDI) do tipo de sonoridade que se pode obter quando se tem os recursos apropriados (tudo depende da máquina):




CONCLUSÃO

Sou um entusiasta do padrão MIDI. Ele, que surgiu para facilitar a interligação de instrumentos musicais eletrônicos, sem querer nos fornece um caminho para a democratização da Música. Graças a ele, qualquer um, hoje em dia, pode fazer música de excelente qualidade. Qualquer um pode produzir, em casa, uma música orquestral, por exemplo, sem precisar do contato com uma orquestra de verdade. Futuramente, falarei sobre o que há de melhor em software e hardware para este padrão.

Obs: não deixe de visitar o SITE DO MUSIC ANIMATION MACHINE.



(veja também: Free Sheet Music Download - DOWNLOAD GRATUITO DE PARTITURAS, uma extensa coleção de links para downloads de partituras gratuitas na Internet)


10 julho 2009

Arquivos MIDI



Download


de músicas MIDI


(Pato Preto, de Tom Jobim, e uma nova versão de Prece, de Vadico e Marino Pinto)




A minha Página de Downloads acaba de receber três novas aquisições: são duas músicas em formato MIDI e uma partitura em formato PDF.

Prece (Nova versão)

As diferenças entre esta versão e a que eu havia disponibilizado dias atrás são poucas e sutis. Basicamente, rearmonizei os compassos 13, 14, 37 e 38, para que ficassem mais parecidos com uma gravação exemplar de Altemar Dutra.

Pato Preto

Esta é uma daquelas músicas de Tom Jobim que muita gente ouve com prazer e nem sabe que é dele. Desta vez, ao contrário do que fiz com Nuvens Douradas, limitei-me a transcrever o que está na partitura (que também tem a letra desta música). Por isto, você verá somente as partes da voz e do piano.

Obs: Este arquivo MIDI, só com o que tem, já está muito interessante, mas eu deixo para algum de vocês (ou para mim mesmo, num futuro não muito distante) a tarefa de torná-lo artisticamente mais bem acabado. Fique à vontade para acrescentar andamentos, dinâmicas, percussão, etc.

OS ARQUIVOS

Download da música Pato Preto:
Tom Jobim - Pato Preto.mid

Download da partitura de Pato Preto:
Tom Jobim - Pato Preto.pdf

Download da música Prece:
Vadico e Marino Pinto - Prece (2).mid

(veja também: Free Sheet Music Download - DOWNLOAD GRATUITO DE PARTITURAS, uma extensa coleção de links para downloads de partituras gratuitas na Internet)




08 julho 2009

O Plágio e a Criatividade (Parte 6)





Contra todas as "evidências",
Não há plágio em Nuvens Douradas

Nos gráficos abaixo (do tipo conhecido como “Piano-roll”), as notas de uma melodia são representadas pelos tracinhos em “negrito”. Cada coluna corresponde a um compasso, e há uma representação do teclado de um piano, à esquerda, servindo como referência para as linhas horizontais.

Obs: Para melhor entendimento deste artigo, seria bom você ouvir ambas as músicas. Se ainda não as tem, ouça as versões MIDI que eu mesmo preparei, e das quais eu extraí os gráficos abaixo. Para isso, faça o Download de Nuvens Douradas e de Prece, clicando na parte de Downloads, na coluna direita desta página.

Observe os gráficos (clique neles para uma imagem maior):

1 . Nuvens Douradas (Tom Jobim):

Gráfico de Nuvens Douradas

2 . Prece (Vadico e Marino Pinto):

Gráfico de Prece

Olhando de relance, ambos parecem tratar-se do mesmo gráfico. Neles, há somente os temas que estamos comparando, sem os acordes. Um matemático diria que há muito mais semelhanças do que diferenças entre eles. Eu, que sou bom de conta, mas tenho também a visão de um músico, diria que, na verdade, é o contrário: existem muito mais diferenças do que semelhanças entre os dois temas acima. Basta que pensemos musicalmente, e não matematicamente (afinal, apesar de existir muita matemática na Música, MÚSICA NÃO É MATEMÁTICA).

Nesses gráficos, além das notas (em negrito), temos também:
. retângulos cor-de-laranja, delimitando, em cada tema, um motivo (ver Fraseologia) e sua repetição;
. setas vermelhas, indicando o ponto em que o motivo irá terminar descendo;
. uma seta azul, indicando o movimento ascendente de um motivo para a sua repetição;
. uma elipse cor-de-rosa, indicando a terceira exposição do motivo em cada tema.

Eis alguns dos possíveis argumentos a favor da tese de que Jobim plagiou Vadico, e os seus respectivas pontos fracos:

Argumento 1 . Os motivos caracterizam-se por começarem com uma nota que se repete durante os dois primeiros compassos:
Resposta: E daí? Tom Jobim conhecia bem a música de Vadico, o que não o proibia (como não proíbe ninguém até hoje) de ter composto um tema só seu começando também por notas repetidas - ainda que Vadico tivesse sido o primeiro a fazê-lo (o que, de fato, não foi, porque isso já é feito há séculos, desde os primórdios da Música).

Argumento 2 . Os motivos caracterizam-se por terem, em seu terceiro compasso, uma nota curta (seta vermelha) que desce para uma mais longa (seta vermelha):
Resposta: Até aí, tudo bem, porque, em Nuvens Douradas, essa nota curta desce quatro semitons, enquanto em Prece ela desce três.

Argumento 3 . Os motivos têm a mesma estrutura (retângulo cor-de-laranja):
Resposta: Ainda que Vadico tenha sido o primeiro ser humano na face da Terra a usar esse tipo de estrutura numa música popular (ou mesmo erudita), ela não pode, em hipótese alguma, ser considerada de sua propriedade. Ouça, no vídeo abaixo, o trecho que começa exatamente aos 1:06:



Não estaria aí a origem do tema usado por Vadico? Sim, não há como negar. E ele o fez de forma consciente, querendo conferir uma certa aura religiosa à sua composição. Fez sabendo que não havia nada de mais. Ora, se ele pode, por que Tom Jobim também não pode?

Agora, olhando as setas azuis:

Argumento 4 . Em ambas as composições, há um movimento de subida entre o motivo e sua repetição:
Resposta: No caso de Nuvens, essa subida é de três semitons, enquanto em Prece é de seis semitons.

Agora, olhando para as elipses cor-de-rosa:

Argumento 5 . Os motivos dentro das elipses, em ambas as músicas, são idênticos:
Resposta: De fato, os motivos são iguais, mas as harmonias (omitidas nos gráficos), não. Em Nuvens, ambos os compassos estão em modo maior (Gmaj7 e G7(#11)), enquanto em Prece estão em modo menor.

Para finalizar, e já que nada do que vai acima é suficiente para caracterizar o plágio, poderíamos tentar mais este argumento:

6 . Os dez primeiros compassos de ambas as obras têm estrutura muito semelhante:
Resposta: Faça-me o favor, aí já é demais. Em ambas as músicas, há seis mudanças de nota nesse trecho, e, embora elas apontem para a mesma direção, são por intervalos diferentes.

Já disse antes que não acho Nuvens Douradas sequer parecida com Prece. Faltava-me, entretanto, uma explicação para achá-las tão diferentes. Uma parte dessa explicação está em tudo o que eu disse acima. Mas há algo que distingue ainda mais uma da outra: as harmonias.

A rigor, quanto mais uma sequência de notas nos sugerir uma harmonia, mais “melodiosa” nos parecerá. Há inúmeros temas famosos que se enquadram nessa definição, como o da Nona Sinfonia, por exemplo, que se impõe por si mesmo, ainda que não haja acompanhamento algum. Uma vez ou outra, alguém resolve apresentar novas harmonizações para velhos temas (Bach costumava reaproveitar um mesmo tema em diversos corais, cuidando, apenas, de lhes dar harmonizações diferentes). Em princípio, um tema pode ser rearmonizado de diversas maneiras. Isso é mais fácil para temas que não nos sugerem harmonia alguma, e mais difícil para temas já baseados em alguma sequência de acordes.

Quando se usa uma melodia composta de notas que não nos sugerem nenhuma harmonia específica, cria-se uma espécie de ambiguidade harmônica que deve ser compensada por uma boa sequência de acordes. Imagine, por exemplo, de quantas maneiras se pode harmonizar o tema de “Samba de uma Nota Só”? Os temas de Prece e Nuvens Douradas caem mais ou menos nesta categoria. Por si sós, não têm tanto apelo. A harmonização é que lhes dá personalidade, transformando-os em verdadeiras “melodias”.

Analisando os dois compassos iniciais de ambos os temas, em Prece vemos que há somente dois acordes, um para cada compasso, ao passo que em Nuvens há quatro (Dmaj7(9), D6, Dmaj7 e Dmaj7(#5)). Além disso, é interessante observar o papel desempenhado pelas “melodias internas” (decorrentes das vozes intemediárias dos acordes, que se destacam frente à imobilidade das notas do tema principal) como um fator a mais que serve para diferenciar as duas obras.

Há, ainda, algo muito interessante a acrescentar sobre a harmonização de Nuvens Douradas: ela tem elementos típicos da música impressionista. Não se trata simplesmente de herdar técnicas desenvolvidas pelo jazz, que também bebeu na mesma fonte (e que também influenciou a própria Bossa Nova), mas de buscar soluções harmônicas diretamente nas origens (em Debussy, especificamente). Em Prece, não há nada disso: a harmonização é bem mais tradicional.

Os primeiros compassos de cada composição, como vimos acima, já contém mais diferenças do que semelhanças (musicalmente falando). Como se isso não bastasse, há também que se considerar a forma, isto é, a estrutura horizontal da obra. O resultado é que, nos compassos seguintes, um abismo começa a se formar entre as duas músicas. E é também onde está, na minha opinião, o melhor de Nuvens Douradas.

Para começar, Vadico encerra o tema com uma cadência. Depois disso, não há nenhum material novo - apenas a repetição do mesmo tema. Jobim, por outro lado, usa a cadência do seu tema como preparação para uma espécie de reexposição surpreendentemente natural do mesmo. Essa reexposição é marcada não somente por ser numa tonalidade distante (vai de Re Maior para Mi bemol Maior) mas, também, por se caracterizar pelo aparecimento de pequenas "novidades". Depois disso, aí sim, uma ponte modulatória de extremo bom gosto nos leva de volta ao tema inicial, em Re Maior. Dessa vez, Jobim parece ter se valido da Forma-Sonata, porque a repetição do tema não ocorre mais com a tal modulação para Mi Bemol (embora aquelas novidades reapareçam aqui em Re Maior mesmo, o que dá à obra muita unidade e concisão).

Prece também tem suas próprias sutilezas. Os acordes de seu início, por exemplo, nos remetem ao clima de outra composição de Vadico, Feitio de Oração (em parceria com Noel Rosa), e aos tempos de Bach (primeiros acordes da Aria na Corda Sol, por exemplo).


E A IMAGEM LÁ NO ALTO?

Antes de terminar, vale aqui uma explicação para a imagem lá no alto deste artigo - que, aparentemente, não tem nada a ver com o que eu disse até agora. É que o plágio, como todos sabem, não é uma exclusividade da Música. Pode ocorrer em qualquer modalidade de manifestação artística. Em tese, portanto, pode existir também nas Artes Plásticas.

Mas ninguém ouve falar em plágio de um quadro ou de uma escultura, não é mesmo? Por que será?

A imagem da esquerda é da Granduca Madonna, quadro pintado por Rafael Sanzio. Já as imagens do centro e da direita são as duas versões conhecidas da Virgem do Fuso, cujo original é de Leonardo da Vinci. Calma, não se trata de falsificações, mas sim de cópias feitas por seus alunos, uma vez que o original tinha sido feito apenas para fins de devoção privada do grande mestre. De qualquer forma, elas servem muito bem para o que eu quero dizer.

Ambas as obras (a Granduca Madonna e a Virgem do Fuso) foram pintadas na mesma época: entre 1500 e 1510. Ora, já que o tema de ambas é exatamente o mesmo, era para vermos aí alguma espécie de plágio. Por que será que isso nem nos passa pela cabeça? Talvez porque este seja um daqueles temas considerados, por assim dizer, de domínio público. De fato, há temas que, em geral, estão para as Artes Plásticas assim como os gêneros musicais estão para a Música. Temos, assim, as Naturezas-Mortas, as Marinhas, etc.

Nas Artes (e na Música, especificamente), esbarramos o tempo todo com fórmulas e arquétipos. O tema da Madona com o menino Jesus em seu colo é somente um desses vários temas recorrentes na história das Artes Plásticas. De tanto vermos quadros sobre o mesmo assunto, este se transforma em gênero, e passa a não interferir negativamente em nossa avaliação de uma obra de arte. Não se olha mais para o tema. Olha-se, isto sim, para a forma como ele é desenvolvido. Analisamos os seus detalhes, tais como os elementos acrescentados por conta e risco do próprio artista (como aquele fuso para o qual o menino Jesus olha com tanto interesse, na obra de Da Vinci), ou as características técnicas da obra, como as proporções, o jogo de luz e sombra, as cores, as pinceladas, etc.

É provável que seja este o motivo pelo qual não se fala em plágio nas Artes Plásticas. Mas fala-se, sim, em falsificação (o que faz muito sentido na Pintura, e não tanto na Música).





MONALISA x MONALIZA


O que há de realmente valioso na Monalisa, o mais famoso quadro de Da Vinci? Por que ela é tão admirada? Por sua originalidade? Se sim, onde estaria essa originalidade? No tema? Bom, mas o tema é simples: uma mulher com um sorriso indefinível e uma paisagem absolutamente secundária ao fundo. Quantos não fizeram o mesmo antes? Imaginemos, então, que, meses antes, alguém tivesse pintado o quadro abaixo:



Qual seria a atitude do tal “artista” depois de se deparar com o quadro de Da Vinci?

OPÇÃO 1: Se jogaria aos seus pés, dizendo: “Mestre, ensine-me a pintar como você!”

OPÇÃO 2: Diria “Assim que bati o olho, percebi que fui plagiado!”, e o processaria.

A resposta a essa pergunta vai depender de ele ser um verdadeiro apreciador da Arte (como deve ser um musicista, no caso específico da Música) ou um artista frustrado e rancoroso.


PURA MÚSICA

Voltando ao que nos interessa, Nuvens Douradas é, na minha opinião, uma das melhores coisas que já se fez na história da Música Brasileira. É uma peça eminentemente instrumental. Não precisa de letra: é música pura. Para mim, se colocarem letra, estraga (embora esta seja somente uma opinião). Para mim, é Música para se ouvir em silêncio, com muita atenção. E ela tem, realmente, muitos detalhes que merecem a nossa atenção. Ouça os acordes. Imagine se é possível mudar alguma nota de lugar, ou mesmo suprimí-la. Cada nota ali é importante. Eu acho que seria um desperdício dar a tais acordes o papel de meros coadjuvantes, como no acompanhamento de um solista, por exemplo. Eles merecem, sim, o papel principal.

Eu fico realmente em dúvida quanto à sensibilidade artística dos que enxergam algum plágio nesta música. Lamento que pessoas do próprio meio tenham tido a coragem de levar adiante tal acusação, cujo único efeito foi o de fazer com que Jobim evitasse de tocar essa música em público. Uma monumental injustiça, e uma grande perda para os apreciadores da boa música.

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