12 junho 2009

O Plágio e a Criatividade





Faz exatamente um ano que a banda inglesa Coldplay lançou o que viria a ser, provavelmente, o mais bem sucedido (e, também, o mais polêmico) álbum de sua carreira. Viva La Vida or Death and All His Friends (título referente a um quadro da artista mexicana Frida Kahlo) obteve um sucesso estrondoso, ganhando três das sete indicações ao Grammy Award que recebeu, entre as quais a de Melhor Canção de Rock, com a faixa Viva La Vida.

Foi merecido? Sim, foi merecido. Confesso, inclusive, que, quando a ouvi pela primeira vez, tive uma agradável sensação de dejàvu. Não, não estou sendo irônico. Sempre tenho dejàvus quando ouço sequências de acordes como a que se repete ao longo dessa música (e que eu comento em detalhes, lá no final deste artigo). Ela flui com tamanha naturalidade que é como se eu já a conhecesse há séculos e séculos. Tomem isso como um elogio.

Tudo ia muito bem até que Joe Satriani, conhecido guitarrista e compositor, decidiu botar a boca no trombone: para ele, o tema principal de Viva La Vida seria uma cópia quase perfeita do tema principal de If I Could Fly, música instrumental de sua autoria. Para os que ainda não sabem do que se trata, ouçam as duas e tirem suas próprias conclusões. Primeiro, Viva La Vida:



Excelente, não? Agora, ouçam If I Could Fly - prestem atenção ao trecho que começa na marca dos 50 segundos:



Grande música, também.

Mas aí veio o Cat Stevens e quis entrar na briga: disse que Foreigner Suite, de sua autoria, tinha sido também plagiada pela banda inglesa. O vídeo abaixo foi preparado especialmente para mostrar uma comparação entre as duas (pulem a parte que fala de Mozart, Armageddon, etc.):



Na minha opinião, o Cat forçou um pouco a barra. Só se ele achou o arranjo orquestral parecido...

Mas, como se não bastassem duas acusações de plágio, veio a terceira, com a banda norte-americana Creaky Boards e sua canção The Songs I Didn’t Write.

Há muito material (textos, vídeos, etc.) na Internet abordando essa encrenca. Uns são contra, outros a favor, e há até mesmo os que ficam em cima do muro. De todo esse material, destaco o seguinte vídeo, por resumir todos os outros que coloquei mais acima, e por servir de introdução ao que direi a seguir:



Faltou o Creaky Boards, não? Nem me dei ao trabalho de procurar a música dessa banda porque, bem antes disso, eles já haviam se retratado, admitindo a possibilidade de que ambas as canções - a deles e a do Coldplay - poderiam ter sido influenciadas pela trilha sonora do video game The Legend of Zelda (???).

Se essa história do vídeo game for verdadeira, trata-se de dois plágios em sequência. Esse encadeamento de plágios, em que “fulano copiou de ciclano, que copiou de beltrano, e assim por diante”, parece ser justamente a tese central do vídeo anterior, e dá o que pensar.

Meus amigos, eu sei que tratar desse assunto é polêmica na certa. Mas, por favor, estejam à vontade para discordar de cada linha que eu escrever.

Em geral, criatividade e plágio são conceitos que, quando colocados lado-a-lado, sugerem uma oposição como a do bem contra o mal, ou a do mocinho contra o bandido. Sinto que há uma simplificação excessiva nessa forma de pensar. Algo me diz, por exemplo, que, se não tomarmos cuidado, daqui a pouco, para cada música de sucesso que se lançar, haverá uma saraivada de acusações de plágio. Só os artistas menos conhecidos escaparão de entrar na roda.

Theodor Adorno, um importante compositor e musicólogo alemão do século XX, sustentava que o uso do plágio é extensivo na música popular (popular music in general employs extensive plagiarism: variety in the musical material occurs in details whereas genuinely original musical content tends to be sparse when compared to classical or art music - clique aqui para ler o documento na íntegra).

Na prática, quase todos os casos de plágio musical de que se tem notícia envolvem trechos relativamente curtos, mas fundamentais para ambas as músicas. A questão é: o que pode, então, ser considerado um trecho suficientemente longo? E se houver uma única nota diferente no meio dele?

Ora, valendo-se de tamanha indefinição, Will Champion, o baterista do ColdPlay, defendeu-se da acusação de Stevens dizendo que “as notas de uma oitava não pertencem a ninguém”.

Coincidentemente (ou não), outro músico famoso já havia se defendido de acusações idênticas em 2004, dizendo que, "afinal, só existem 12 notas". Tais palavras devem ter soado arrogantes demais aos ouvidos de Frank Behrens, colunista do site Art Times, motivando-o a produzir um artigo aparentemente demolidor. O pior é que ele é tão persuasivo que quase nos convence de que está com a razão.

Mas eu também sou músico e entendi muito bem o que o meu colega quis dizer com “só existem 12 notas”. Quanto ao artigo, o seu autor pode até impressionar alguns desavisados com o seu domínio da Análise Combinatória, mas, para mim, está sofismando, ao tratar as “12 notas” como se fossem, por exemplo, os 12 signos do Zodíaco, e não os 12 semitons de uma escala musical. Fica até difícil de entender como um texto desses consegue ser aceito numa publicação especializada em artes.

Tudo o que Behrens disse seria válido se estivéssemos falando de loterias, não de música. Cada nota de uma composição, do ponto-de-vista tanto melódico como harmônico (e ele deveria saber disso), está ligada às demais por regras de contraponto, harmonia, etc. Só isso já seria o bastante para reduzir significativamente o número de maneiras com que elas podem ser combinadas sem perderem a coerência que nos faz percebê-las como música. Sem falar das restrições impostas pelo gênero escolhido para a composição, das quais o compositor não pode fugir sem que seja incompreendido pelo seu público.

Voltando ao ColdPlay, quero aproveitar um gancho deixado por Champion em sua defesa, ao dizer que “existem 12000 composições com a mesma sequência de acordes”. Ora, o leigo em música (o mesmo que acreditou no artigo de Frank Behrens), pode até achar que isso é o mesmo que dizer que “eu não sou o único a plagiar”. Eu não acredito que um músico de verdade vá deixar de entender o que ele quis dizer. Eu entendi. Não sei de que forma ele chegou a esse número, ou se é só força de expressão, mas o que ele quis dizer é que é certamente muito fácil encontrar músicas com a mesma sequência de acordes. È só procurar.

Mas, será que o problema se resumiria à sequência de acordes? Vou analisar, primeiro, o caso ColdPlay x Satriani, por ser o mais “evidente”.

Sequência de acordes:

Viva La Vida (Coldplay): C# - D# - G# - Fm

If I Could Fly (Satriani): Em7 – A – Dmaj7sus2 – Bmadd4

Os acordes são basicamente os mesmos (se transferidos para o mesmo tom, é lógico). No primeiro caso, os acordes correspondem à sequência de graus IV - V - I - VI. No segundo caso, a sequência é a mesma (omitindo-se as dissonâncias, para facilitar a comparação), com exceção do primeiro acorde, que, em vez de ser do IV grau, é do II grau. Essa única diferença, no entanto, eu acho que nem existe, uma vez que a sétima acrescentada ao acorde de II grau reforça ainda mais o seu caráter de sub-dominante, tornando-o praticamente igual ao do IV grau. Satriani coloca um temperinho, formando dissonâncias com notas emprestadas da própria melodia, mas a sequência harmônica é, basicamente, a mesma. É interessante notar que ele, na introdução de sua música, já usa um acorde Gmaj7, que é o acorde de IV grau acrescido de uma sétima, que, por sinal, antecipa a nota inicial da melodia em questão. Se esse acorde tivesse sido colocado no lugar do acorde de II grau, teria funcionado do mesmo jeito, e aí é que não teríamos como negar que as duas sequências harmônicas são idênticas.

Agora, as melodias:

Viva La Vida (Coldplay):
Tema de Viva La Vida

If I Could Fly (Satriani):
Tema de If I Could Fly

Assinalei em vermelho os trechos que eu considero iguais. As notas seguintes seguem caminhos diferentes: enquanto Satriani insiste nas bordaduras, terminando nas três notas sincopadas, o tema de Viva La Vida termina com movimentos bem diferentes. Mesmo assim, juntando as duas coisas, melodia e harmonia, fica tudo realmente muito parecido.

Se fosse somente pela sequência de acordes, eu diria que Satriani não poderia reclamar de nada, pois, como se alega no vídeo abaixo, ele não teria sido o primeiro a usá-la. Um grupo chamado “Enanitos Verdes” (quem???) já teria chegado na frente. Vejam:



É… não tenho dúvidas de que essa sequência de acordes é realmente bastante comum mesmo, mas o vídeo acima, que me desculpem, não ilustra tão bem assim essa tese.

No próximo post, direi o que penso a respeito daquele famoso caso Jorge Ben Jor x Rod Stewart, além de outros casos envolvendo artistas nacionais, como Roberto Carlos, Fagner e Tom Jobim. Quero falar, também, um pouco mais sobre sequências de acordes. Até breve.

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09 junho 2009

ROLAND FANTOM G (Parte 8)




Resumo

A Fantom G tem muitas outras cartas na manga: banco de acordes (possibilitando emissão de acordes complexos com o uso de um só dedo), acordes arpejados como num violão, um modo pitch-bend inovador que permite manter-se uma nota presa enquanto se varia uma outra (à la Jimi Hendrix), um arpeggiator, um step LFO (empregado engenhosamente para criar beats e synth phrases), além de detecção de sample beat com Recycle-style sample slicing... Só não encontrei ainda um acessório que sirva para tirar pedras dos cascos de um cavalo, mas a Roland provavelmente já deve estar trabalhando nisso (a atualização v1.2 foi liberada justo quando nós estávamos para publicar este artigo; nessa atualização, não há ainda aquele acessório de que falei, mas foram incluídas algumas melhorias no sistema de gravação e sequenciamento que chegaram tarde demais para que pudessem ser testadas para este artigo).

Workstations são ferramentas versáteis, mas, sempre que se tenta fazer coisas demais, corre-se o perigo de não fazê-las todas com a mesma qualidade. Sendo crítico ao extremo, poderia ser dito, por exemplo, que o editor de aúdio de uma Fantom G não rivaliza com o do Pro Tools, ou que suas formas-de-onda perdem em alcance e profundidade na comparação com os samples das bibliotecas especializadas, ou que ele simplesmente não tem aquelas opções de programação mais complexas que seriam encontradas num sintetizador analógico mais sofisticado, mas dizer tudo isto seria o mesmo que ignorar o mais importante: a força da Fantom G está exatamente no fato de ela abranger todas essas facetas, fundamentais para o trabalho de um profissional dessa área, e as combinar convenientemente num único pacote.

Uma última reflexão: a minha experiência me diz que leva um certo tempo até que se extraia o que há de melhor em teclados complexos como este, e os momentos de maior satisfação geralmente só ocorrem depois que já se está mais familiarizado com as funcionalidades mais profundas e sutis. A Fantom G tem recursos de programação aos montes, e explorar todas as suas possibilidades deve garantir, por uns bons anos, muita diversão para os músicos mais criativos. Até lá, a Roland provavelmente já estará comercializando algo como a Fantom Z (ou talvez se mudado para um produto que se chame, sei lá, “Spectre SD” - que, depois de compor e gravar uma sinfonia para você, irá preparar também o seu jantar). Qualquer que venha a ser esse futuro, um teclado do nível de uma Fantom G jamais perderá o seu extraordinário valor musical.


O Retorno da Fantom:O sistema de geração de sons da workstation Fantom, da Roland, baseia-se no módulo XV5080, da mesma fabricante, já analisado na SOS de Novembro de 2000 (veja em www.soundonsound.com/sos/nov00/articles/rolandxv5080.htm). A Roland inaugurou sua linha Fantom em 2001, aperfeiçoando-a continuamente desde então. Pode-se acompanhar este processo nos seguintes artigos de SOS:

Fantom FA76 (Fevereiro de 2002)
www.soundonsound.com/sos/feb02/articles/fantom0202.asp
Fantom S/S88 (Outubro de 2003)
www.soundonsound.com/sos/oct03/articles/rolandfantoms.htm
Fantom X6/X7/X8/XR (Setembro de 2004)
www.soundonsound.com/sos/sep04/articles/rolandfantomx.htm

A Fantom FA76 não tinha sampling e não podia ser conectada a um computador (um drive de disquetes era usado para salvar dados). Samples de usuários passaram a ser aceitos com o modelo “S”, que também incorporou os pads dinâmicos e substituiu o drive de disquetes por um slot de cartões Smart Media e pela USB. A Fantom X foi um dos primeiros teclados a incorporar uma tela LCD colorida.

A Roland aperfeiçoou continuamente as especificações de sua famíia Fantom ao longo de sete anos. Eis uma breve descrição dessa evolução, passo-a-passo:



Fantom: FA76 Fantom S Fantom X Fantom G
Ano de lançamento: 2001 2003 2004 2008
Polifonia máxima: 64 vozes 64 vozes 128 vozes 128 vozes
Memória disponível para formas-de-onda (ROM): 64MB 64MB 128MB 256MB
Formas-de-onda: 1083 1228 1480 2230
Patches (pré-configurados): 640 + 256* 648 + 256* 1024 + 256* 1664 +256*
Patches (de usuários): 128 256 256 512
Coleção de Ritmos (pré-configurados): 16 + 9* 32 + 9* 40 + 9* 64 + 9*
Coleção de Ritmos (de usuários): 16 32 32 64
Performances (pré-configuradas): 64 (m) 64 (m) 64 (m) 512 (8)
Performances (de usuários): 64 (m) 64 (m) 64 (m) 512 (8)
Sistemas multi-tímbricos (pré-configurados): 16 (16) 16 (16) 16 (16) 8 (16)
Sistemas multi-tímbricos (de usuários): 16 (16) 16 (16) 64 (16) 128 (16)
Memória RAM para samples (de fábrica/máximo): — 32/288MB 32/544MB 32/1GB
Efeitos: 90 77 70 78

Legendas:
* = General MIDI 2 patches
(m) = monotímbrico
(8) = muti-tímbrico com 8 partes
(16) = muti-tímbrico com 16 partes

Obs:
1 . A partir da atualização v1.2 (liberada justo quando estávamos para publicar este artigo). a Fantom G passou a aceitar 1GB de RAM.

2 . Na Fantom G, o que eram, inicialmente, “Performances” monotímbricas, e depois passaram a ser multi-tímbricas com 8 partes, agora são chamadas de “Live Sets”, enquanto os sistemas Multi-tímbricos com 16 partes são agora referenciados como “Studio Sets”.


Meus Favoritos:

As configurações que a Fantom G traz de fábrica têm muito a oferecer. Eis uma breve seleção de algumas das que mais me agradaram:

Single Patches:

80 Pure EP:
Um verdadeiro Fender Rhodes (ao menos eu o achei bastante realístico!), multi-sampleado muito corretamente. O som metálico como o de um sino é reproduzido fielmente, e as dinâmicas em quatro camadas conseguem capturar todas as variações de timbre do instrumento.
131 Remember: Um pad com som onírico e etéreo.
196 Himalaya Ice: Perfeito como fundo para um documentário de TV sobre a Antártica (podendo sonorizar, por exemplo, o surgimento de um iceberg).
521 6-Str Bass Brt. 1: O melhor baixo elétrico “clean” que eu já ouvi de uma workstation.
901 Tpt Soloist 3: Um solo de trompete orquestral brilhante e impositivo, ótimo para fanfarras.
1302 Chaos 2003: Um pad com um som belo, nervoso e cambiante.
Live Sets:

004 Dream Lead: Uma guitarra lead seca, incrementada pelo som bombástico de um death metal bass.
015 Westminster Abbey: Som de órgão de uma gigantesca catedral.
026 Techno Shredder: Enquanto sua mão esquerda ativa grooves de funk, a direita toca uma guitarra lead com distorção e palm-muted. Resultado: horas de divertidas jam sessions.
030 Liquid Nylon & Strings: Absolutamente celestial, um sonho para os improvisadores.
035 Cinema Str & Timp: Ótimo para compor música incidental de filmes melodramáticos.
041 Mega-G Synth: Mega, este som é, com certeza - especialmente pelo final retumbante.

Roland Fantom G

prós:
Contem uma enorme e versátil coleção de patches e de configurações multi-tímbricas, e espaço de sobra para salvar as do próprio usuário.
Excelentes samples de piano Rhodes, órgão de tubos, baixos e guitarras acústicas e elétricas.
Reverberação excelente.
Sequencer com 24 trilhas de áudio e 128 trilhas MIDI.
Trabalha com multi-samples inseridos pelos usuários.

contras:
Não importa bibliotecas de samples de terceiros, apenas os dados brutos dos arquivos WAV e AIFF.
Não reconhece os pontos de loop.
Não tem um controle panorâmico para os samples individuais de usuário.

final:
A workstation Fantom G, da Roland, tem algo de bom para cada um de nós – uma gama enorme de patches feitas sob medida para os tecladistas, pads dinâmicos e menus completíssimos para os programadores, gravação de áudio em multi-trilha e sequenciamento MIDI para produtores, além de recursos avançados de slice, dice e loop para os que gostam de mexer diretamente nos samples. Juntando tudo isso num único produto, o que teremos será uma workstation sofisticada, bem projetada e solidamente construída, com grande capacidade de expressão musical.

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08 junho 2009

ROLAND FANTOM G (Parte 7)




Especificações do Teclado




Roteamento de efeitos ao estilo Fantom G. Observe que o envio de efeitos para cada um dos quatro tons num patch tem a sua própria configuração





Eu certamente ficarei muito feliz no dia em que tocar uma Fantom G ao vivo para o meu público de adoradores (embora esteja cada vez mais complicado de achar esse meu público, e eu ainda esteja trabalhando para que ao menos uma parte dele realmente me adore). As sete oitavas de extensão do G8 são uma tremenda bênção para os pianistas (minha mulher ficou maravilhada ao descobrir que, nele, poderia tocar as notas finais, extremamente graves, de sua peça clássica favorita), e a capacidade de cobrir a extensão completa de uma orquestra sem usar botões de transposição de oitavas é uma vantagem quando se trabalha com bibliotecas de sons orquestrais. A superfície um tanto fosca das teclas do G8 é agradável ao toque. Os conservacionistas e os elefantes ficarão muito aliviados ao saber que elas não são de marfim, mas os fabricantes procuraram imitar-lhe a aparência, deixando-as ligeiramente amareladas.

Tendo começado minha carreira como organista, o meu toque é mais adequado aos teclados eletrônicos do que aos pianos acústicos. Talvez por isso, e devido, também, às limitações de minha técnica pianística e aos meus dedos relativamente curtos, as teclas pesadas do G8 me impuseram, no início, certa dificuldade nas passagens rápidas. Apenas uns poucos dias de prática, no entanto, foram suficientes para que eu me adaptasse, e até começasse a apreciar cada vez mais o toque pianístico desse teclado. Programadores de ritmos talvez se dêem melhor com um G6 ou G7, uma vez que a maior leveza de suas teclas proporciona um ricochete mais rápido, facilitando, assim, a execução rápida de notas repetidas, tão curtas que seriam inviáveis num teclado G8.

O peso da G8 (uns 33,5kg), e o seu tamanho (1,40 x 0,48m), são uma desvantagem na estrada. Estremeço só de imaginar o quanto ela pesaria se estivesse embalada para uma viagem de avião – portanto, a menos que se esteja realmente precisando de seu toque pianístico e/ou de suas 88 teclas, o ideal mesmo seria optar pelos modelos G7, de 76 teclas, e G6, com suas cinco oitavas (pesando, respectivamente, 16,7 e 14,5kg). Seria muito mais prático, e haveria um risco menor de se terminar uma apresentação com dores nas costas. Para quem pretende se apresentar ao vivo, é bom ter em mente que ele não liga instantaneamente. Mesmo sem nenhum sample para carregar, ele precisa de 15 segundos para, uma vez ligado, entrar no playing mode. O mesmo pode muito bem acontecer a outras workstations, é verdade, mas achei importante fazer este alerta porque as fontes de alimentação podem sofrer falhas ocasionais justamente quando se está numa apresentação, ainda mais quando as condições são caóticas (o que não é nada impossível de acontecer). E, quando se está sob a luz dos refletores, esses 15 segundos podem parecer uma eternidade.

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07 junho 2009

ROLAND FANTOM G (Parte 6)




Desnudando o Sampling

Como nas versões anteriores da Fantom, também nesta se pode gravar e reproduzir áudio. Os 32 MB de memória disponibilizados para este propósito estão longe de ser um exagero, mas ao menos pode-se expandí-los até o máximo de 1GB com a instalação de cartões DIMM. Embora a gravação de áudio neste equipamento seja um processo bastante simples, o mesmo não ocorre quando se tenta importar samples de terceiros. Por volta do ano 2000, a Roland comercializava o XV5080, um módulo de som capaz de importar samples da Akai e da própria Roland. Parece estranho, portanto, que o teclado sobre o qual estamos falando neste artigo, justamente por ser muito mais moderno e eficiente, não seja capaz de importar instrumentos diretamente de uma biblioteca de samples – ele até reconhecerá os dados brutos contidos nos arquivos de áudio em formato WAV e AIFF, mas ignorará todos os dados de formatação (incluindo os pontos de loop). Para se reconstruir um instrumento que tenha pontos de loop, primeiro os seus samples terão que ser importados, e, a seguir, os seus parâmetros, o mapeamento e os pontos de loop deverão ser inseridos manualmente. Trata-se de um trabalho realmente maçante. Por sorte, a Fantom G sampleia a uma taxa de 44,1kHz, exatamente a mesma com que são formados os samples da grande maioria das bibliotecas, o que aumenta as chances de essa cópia manual produzir bons resultados (se, por outro lado, os samples tiverem sido gravados em uma outra taxa, 48k, digamos, é bom já ir pegando uma calculadora e uma aspirina...).

Eu ajustei a Fantom G para a tarefa, relativamente simples, de reconstruir uma flauta de osso étnica da biblioteca Dirk Campbell’s Origins, originalmente criada para o sampler EXS24. A Fantom G não teve problemas com a importação dos samples em formato AIFF a partir de uma memória USB. Feito isso, eu coloquei o teclado em seu modo multisample (uma melhoria acrescentada pelo fabricante na última hora, tanto que nem é mencionada ainda em seu excelente manual do usuário) e passei a copiar os parâmetros EXS manualmente. Depois de quebrar a cabeça com o sistema de mapeamento (nada intuitivo, por sinal), comecei a encaixar, cuidadosamente, os pontos de partida, os pontos de loop, fazer o ajuste fino, e até mesmo o ajuste normal de cada trecho do loop. A única coisa que me fez falta, nessa hora, foi a implementação de um controle panorâmico para os samples individuais, mas isso não chegou a ser um empecilho. O procedimento foi moroso, e está longe de ser o ideal, mas funcionou.

Num mundo ideal, deveria ser possível ligar a Fantom G a um computador, selecionar, dentre os arquivos do HD, o da “EXS24”, por exemplo, clicar em “convert instrument”, distrair-se com o Teletext em busca das fofocas excitantes do showbiz enquanto o teclado processa os dados sampleados, e uns poucos minutos mais tarde poder tocar a sua Fantom com todos os sons da EXS24. Do jeito que as coisas são, no entanto, isto não passa de um sonho, mas, admitamos, os poucos samples que se conseguir importar já são melhores do que nada.

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